Eu
estava lavando carros no centro da cidade quando um conhecido me parou na rua.
“Rapaz, corre tua casa. Estão te velando lá, achando que você morreu!”. Ôxe, se
eu estava ali, comopra podiam estar fazendo meu velório? Liguei para minha
família e uma sobrinha atendeu. Assim que falei que era eu, ela desligou na
minha cara. O jeito era ir até lá para mostrar que eu estava vivo, gente!
Tive
de acalmar o pessoal: pensaram que eu era um fantasma
Quando
cheguei na casa da minha mãe, tinha um caixão no meio da sala, gente chorando
em volta e toda uma tristeza no desmaiar e um bando de gente sair correndo,
achando que eu era um fantasma. Até eu fiquei assustado!Quando olhei dentro do
caixão, foi minha vez de ficar impressionado: o defunto era igualzinho a mim.
Cheguei a me perguntar se era eu mesmo ali dentro! Mas depois fiquei tranquilo.
Se eu estava vivo, é porque aquele ali era outro.Aí, tratei de acalmar minha
família. Despertamos minha ex-mulher, abracei todo mundo e fiquei esperando
minha mãe chegar. Ela estava no cemitério, acertando os detalhes do meu
sepultamento. Quando voltou, a pobre nem conseguia acreditar que eu continuava
vivinho da silva. Me abraçou cheia de alegria! Depois, a polícia apareceu e
levou meu sósia! Essa confusão toda só aconteceu porque eu não via minha
família havia uns quatro meses. Tinha saído de casa para viver minha vida e
passei a trabalhar lavando carros para me bancar e ajudar a sustentar meus dois
filhos, com quem nunca cheguei a perder contato.
Depois
desse tempão sem falar comigo, minha mãe e meus irmãos acreditaram quando um
conhecido avisou para eles que eu tinha morrido num tiroteio. Então, foram até
o IML (Instituto Médico Legal) e reconheceram o corpo. Não era pra menos: o
cara tinha a minha altura, a minha cor, o meu corte de cabelo, a mesma barbicha
e até os dentes da frente faltando, igualzinho a mim!Apesar do sofrimento
geral, essa história teve seu lado positivo: vendo como todos se angustiaram
pela minha morte, percebi o quanto minha família me amava e decidi voltar para
a casa da minha mãe. Estamos mais unidos do que nunca. Tenho a impressão de que
morri e revivi para ter uma chance de me redimir pela minha ausência nos
últimos meses.
Agora
tenho que provar para a Justiça que estou vivo
Como
perdi minha carteira com meus documentos no mês passado, tudo o que tenho hoje
é a certidão de nascimento e a de óbito. Então, agora preciso convencer a
Justiça de que estou vivo. Assim, anulo o óbito e posso refazer meu RG e CPF.
Mas não reclamo; antes isso do que estar naquele caixão como o tal defunto, que
já foi identificado e enterrado.- GILBERTO ARAÚJO, 41 anos, lavador de carros,
Alagoinhas, BA
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